quarta-feira, 13 de maio de 2009

Blogs e utopia!


“Portanto, é a natureza de instrumento que é louvada nas virtudes, quando se faz o elogio delas, e também o impulso cego dominante em cada virtude, que não é mantido nos limites pelo interesse geral do indivíduo; em suma: a desrazão da virtude, mediante a qual o individuo se deixa transformar numa função do todo. O elogio das virtudes é o elogio de algo privadamente nocivo – de impulsos que destituem o homem do seu nobre amor-próprio e da força para suprema custódia de si mesmo – É verdade que, para a educação e para a incorporação de hábitos virtuosos, enfatiza-se uma série de efeitos da virtude, que fazem parecer irmãs a virtude e a vantagem pessoal – e existe realmente essa irmandade!” (Friedrich Nietzsche – A Gaia Ciência, pág.70, aforismo 21)




O renascimento do romantismo utópico é algo que hoje mais do que nunca deveria ser estimulado. Em tempos de elogios cínicos de virtudes empobrecedoras do individuo a favor da coletividade. Onde a virtude do trabalho é colocada acima do desenvolvimento do mesmo (tanto do trabalho quanto do individuo), é preciso resgatar a idéia de um enriquecimento próprio em detrimento dos lugares comuns do que esta posto. Descobri a beleza do adjetivo utópico no seu berço etimológico grego: u-tópos – aquilo que não tem lugar. O virtual? O homem médio em plena era da virtualidade é ensinado a desacreditar do que possa ser criado, de qualquer movimento do vir-a-ser, do que ainda não está aí, nem aqui.
Se nos reapropriassemos de uma idéia forte de utopia, idéia primordialmente imanente, pois não espera aquilo que virá do céu, milagre ou dádiva, seria também necessário pensar-mos etimologicamente na própria idéia de “Virtu”. A saber: “A virtus é a qualidade de um vir digno desse nome, o que poderá ser... Pois o termo designa de modo geral, a realização em cada um de sua natureza.” (Vocabulário Latino da Filosofia, Jean-Michel Fontanier)
Assim pensamos que utopia e virtude podem andar de mãos dadas, enquanto elementos possíveis de criação. Para além de qualquer receita ética, gostaríamos de destacar apenas que, mediante uma reapropriação de possibilidades que nos fazem não perceber, não ser visto ou conhecido, é possível potencializarmos nosso dia a dia, nossos anseios. Para além do olho único da TV, uma busca de novos horizontes e agenciamentos, aprendizado pela dor do isolamento e da solidão auto-proclamada. Solidão nos meios próximos como único resquício capaz de pensar a si e a outrem. Espaço da alteridade potente o suficiente para a corrida em busca da estética da existência... Uma outra ecologia do virtual, como espaço e tempos recuperados!O espaço virtual é uma selva não tenha dúvidas, porém também um zoológico, determindados sitios carregam uma dupla potência, reterritorializar e desterritorializar. Afinal os estratos sedimentam-se e explodem em qualquer território e a internet não é diferente.
O weblogger Carlos Inácio vem provando que na busca da criação de espaços virtuais é possível sim, atualizar, traçar potentes agenciamentos insuspeitos até então. Seu blog Born Too Lose, tem rizomatizado de forma a compor linhas de fuga criadoras de resistência. Potencializando a arte de um local remoto do nosso país: Ponte Nova. Ao mesmo tempo em que dá visibilidade aos artistas locais, Krlim como é conhecido entre os amigos de lá e de cá, desenvolve relevantes avaliações estéticas acerca dos seus conterrâneos. Filho e irmão de artistas esse saxofonista, violonista, filosofo profissional sem perder o amadorismo - causa de toda paixão -, além de desenvolver sua escrita poética faz o que de melhor se pode hoje em dia: faz o link. Fazer o link, não é simplesmente se ligar a algo, antes deveríamos pensar no link como uma porta ou uma flecha que nos leva ao desconhecido. Neste caso os trabalhos que nos são apresentado, são de uma diversidade e qualidades impressionante: Artes plásticas, fotografia, música e escultura.

A vontade de escrever este pequeno texto surgiu justamente da percepção desta potente movimentação. Perceber como um sentimento irrompe, e consegue congregar multiplicidades num projeto onde a criação de um lugar (topos) é fruto de uma atitude e de um objetivo individual (romântico). Movimento minoritário por excelência, reconhecimento da possibilidade da criação de outros enunciados, repatriamento dos filhos de uma terra localizada, em pleno Virtual! Os modos de fazer se apresentam a todas as forças criadoras no exato momento que essas se põem a dançar na beira do abismo, afastando de si as certezas e objetivos pré-estabelecidos de vantagem e engrandecimento egoísta. É hora de perceber o horizonte como um deserto seco, rude, migrar até lá e povoa-lo, se atentar para esta potência ecológica que pode ser o virtual, que cresce se prolifera pelos quatro cantos do mundo, apróxima os homens e mulheres que possuem interesses afins na mesma medida que domestica os que aqui/lá entram em busca de um pequeno remédio contra o tédio.

Elemento que pode ser de resistência, portfólio para artistas, busca de materiais artísticos, democratização da informação, destruição definitiva do copyright. Possibilidade de recriação subjetiva, elemento de potencialização do auto-didatismo... Elencar as possibilidades e correr para desbravar esta mata, encontrando suas próprias trilhas é a função de cada um. Não há receita pronta nem para as virtudes nem para as localizações. Não se deixar prender no zoológicos virtuais, a internet será o nosso deserto, pombo correio e sinais de fumaça, uma seta lançada na direção do futuro...


Ps: Para conhecer o trabalho do Carlos Inácio e dos agregados e blogs amigos que ele criou é só acessar:

http://www.krlim.blogspot.com/

Um comentário:

Carlos Inácio Coelho Neto disse...

Bom, nao sei se o blog está cumprindo os objetivos propostos, contudo, como voce mesmo conseguiu identificar, está presente em sua proposta costurar certos pontos de modo a criar uma teia de comunicaçao onde as pessoas possam encontrar caminhos que as conduzam aos mais variados lugares.

No texto em que tento traçar um perfil da produçao artistica pontenovense atual, usei uma palavra que há muito tempo nao recorria para expressar um estado de espirito proprio. Isso deve-se muito ao fato de ter identificado uma produçao na cidade em que todos os envolvidos estao ligados por um vinculo de amizade.

o problema, e daí a utopia o romantismo e todo este bla bla bla, é que estes artistas embora sejam amigos, muitos de infancia, nao se articulam de modo a realizar coisas juntos. Meu projeto utópico do momento é ligar todos estes amigos em torno de um so projeto que é o do Documentario sobre o Escultor Antonio Inacio, artista de uma outra geraçao.

O que percebo é que há produçao artistica de qualidade em PonteNova, mas que nao tem força porque nao há uma mobilizaçao no sentido de dar visibiildade a esta produçao.

Por exemplo, não há uma interlocuçao entre os artistas mais velhos com os mais jovens. A ligaçao, quando ocorre, fica no ambito da amizade, na esfera da conversa fiada e por ai vai.

Sei que se surpreendeu quando referi a minhas espectativas usando os termos utopia e romantismo, mas que fique claro, este flerte se dá sem tirar os pés do chao, graças àquela pontiha de pessimismo, uma dose quase homeopatica, que impede que a utopia e o romantismo se tornem um delirio do qual nao nasce fruto algum.

Infelizmente para que a utopia se torne algo de concreto, e o romantismo tenha algum efeito de fato, é preciso que as demais pessoas, das quais se espera uma açao efetiva, estejam na mesma sintonia.

Valeu pelo texto, fiquei imensamente honrado em ter te inspirado a produzir um texto como este.

Que a utopia se torne realizaçao.

te mais