sábado, 20 de setembro de 2008

O Poeta Claudio Willer



POÉTICA

1

então é isso
quando achamos que vivemos estranhas experiências
a vida como um filme passando
ou faíscas saltando de um núcleo
não propriamente a experiência amorosa
porém aquilo que a precede
e que é ar
concretude carregada de tudo:
a cidade refluindo para sua hora noturna e todos indo para casa ou então marcando
encontros improváveis e absurdos, burburinho da multidão circulando pelo centro e
pelos bairros enquanto as lojas fechadas ainda estão iluminadas, os loucos discursando
pelas esquinas, a umidade da chuva que ainda não passou, até mesmo a lembrança da
noite anterior no quarto revolvendo-nos em carícias e mais nosso encontro na morna
escuridão de um bar - hora confessional, expondo as sucessivas camadas do que tem a
ver - onde a proximidade dos corpos confunde tudo, palavra e beijo, gesto e carícia
TUDO GRAVADO NO AR
e não o fazemos por vontade própria
porém por atavismo

2

a sensação de estar aí mesmo
harmonia não necessariamente cósmica
plenitude muito pouco mística
porém simples proximidade
da aberrante experiência de viver
algo como o calor
sentido ao estar junto de uma forja
(talvez eu devesse viajar, ou melhor, ser levado pela viagem, carregar tudo junto,
deixar-se conduzir consigo mesmo)
ao penetrar no opalino aquário
(isso tem a ver com estarmos juntos)
e sentir o mundo na temperatura do corpo
enquanto lá fora (longe, muito longe) tudo é outra coisa
então
o poema é despreocupação

Este é um album clássico, o encontro entre esses dois monstros sagrados do jazz, nos eleva a alturas não habituais. Vemos claramente a segurança e experiencia de Elligton no piano e a juventude e força inventida de Coltrane nos seus sempre inspirados solos. Aos amigos que estão vendo este post só desejo que baixem este album com urgência, o prazer é garantido!!!!

Aqui o link para baixar o album, copie e cole no seu navegador: http://sharebee.com/7c955069

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Depois daquele sopro!!!



Barossinho & Maracatamba - O Sopro Do Espírito[2001]


Depois do sopro de Barrosinho e Maracatamba, nunca mais serei o mesmo. Duvida? Então confira http://rapidshare.com/files/450185/barrosinho_maracatamba.rar.html

Depois de devidamente baixado e degustado(pelo menos inicialmente), confira esse belo texto:

O saxofonista dos saxofonistas John Coltrane, quando deu luz ao épico A Love Supreme, em 1964, iniciava no jazz um novo conceito, tanto nos improvisos que apresentavam uma liberdade única quanto nas composições, que para o idioma jazzístico tiveram a mesma importância dos experimentos progressistas de Stravinsky na música clássica.

No mesmo período, vários expoentes do mesmo instrumento e contemporâneos de Coltrane, como Clifford Jordan, Sam Rivers e Charlie House, não perseguiam a técnica enquanto foco central e sim como uma ferramenta para construir e desconstruir se necessário. Esse foi o ponto de partida musical e filosófico de uma veia importante do jazz pouco conhecida, o post-bop. Nela cabia o afro-jazz engajado do selo independente dos anos 70 nova-iorquino Strata-East - com Stanley Cowell, Charles Tolliver, Shamek Farrah, Bill Lee (o pai do cineasta Spike Lee, quer dizer... O Spike é que...). Na mesma corrente também atuavam o selo californiano Black Jazz - com Doug Carn, Henry Franklyn e Rudolph Johnson - e o Tribe, formado por músicos de Detroit - como Wendell Harrison e Phil Ranelin -, que participavam das gravações dos hits da Motown e se organizaram para um selo que não ''sugerisse'' a enésima rearmonização de Stella by starlight, mas um trabalho de assinatura, assim como vinha desenvolvendo o mentor espiritual dessa geração, Coltrane. Isso sem falar em John Handy, Randy Weston, Arthur Blythe, Anthony Braxton, Sonelius Smith e milhares de outros.

Leitura moderna - Na música brasileira, esse senso de improvisação e composição aparece, entre outros nomes, nos discos do nosso spiritual jazzy Victor Assis Brasil, passando por Nivaldo Ornellas, no final antológico de Beijo partido, do disco Minas, de Milton Nascimento - que tem uma das jóias do compositor, a instrumental-vocal Leila, com Edison Machado dando uma leitura moderna que Elvin Jones, baterista do quarteto de Coltrane, também daria -, até os paulistanos do Pé Ante Pé, em 1982, com um dos mais interessantes LPs de jazz lançados aqui, o não disponível em CD Imagens do inconsciente. A partir desse momento entramos na era ''Eletric Band'' ou ''Plastic Band' ou até ''Elastic Band'', onde o tecnicismo é a maior virtude e a influência asséptica da Berkley School of Music - que cada vez mais se mostrou indispensável - e os vários cursinhos que os americanos inventaram para transformar tudo e todos em jazzistas de canudinho na mão, prontos para integrar a última banda de Chick Corea, se tornaram fundamentais para a estética atual do jazz. É óbvio que o talento se beneficia da técnica, de Moacir Santos a Charles Mingus, só para citar dois gênios que podem realmente endossar esse famoso jargão universitário, mas o que se tem ouvido nos últimos anos é uma euforia olímpica onde o grande trunfo é uma ginástica musical de vencedores e perdedores. Fui ao cinema assistir a um documentário que me deu angústia imaginar que, para as ''cabeças incríveis'' (seriam os antigos formadores de opinião?), a única saída de inventividade na música eram dois toca-discos, um DJ arranhando os discos às vezes interessante, percussivo, original, mas...Calma, minha gente... A saída mesmo foi a livraria em frente, onde, completamente atordoado, tenho a felicidade de me deparar de cara com a cura: o CD O sopro do espírito, do trompetista Barrosinho.

Improvisação - Disco do Barrosinho na mão é dever de casa, aula de comportamento, conceito e o verdadeiro lifestyle do jazz. José Carlos Barroso, a voz ''avant-garde'' da banda Black Rio traz de volta um espírito de improvisação e composição que pareciam ser no mundo de hoje raras peças de museu, mas ufa! Finalmente.

A mão do compositor aqui transborda coerência e sabedoria, da primeira à última faixa não tem assunto jogado fora. Unção, o tema abre-alas do CD, com a tinta polirrítmica com que Barrosinho criou o Maracatamba - simbiose de samba, soul-jazz, afro 6/8 - e uma clave latina sutil que o baterista Jacutinga e os percussionistas Darcy da Serrinha e Dom Gravata pincelam no disco inteiro, me deixou de coração na boca logo. E o improviso do trompete já vem rasgando a emoção e imprimindo a carteira do fã-clube do mestre sem esquecer do solo melódico a la Lennie Tristano do pianista Tomas Improta. A seguinte, Cidade de Palha, parece que foi moldada para o estilo funky-brasileiro do baixista Carlos Pontual, que também tem grande momento no tema 6/8 Rio de jauleira. Os dias de chuva de qualquer um que tenha um coração no peito nunca mais serão os mesmos depois da balada Espírito Santo, um tema com o ambiente das composições do pós-hard-bop que Wayne Shorter adoraria tocar junto, com certeza, e eu já devo ter ouvido essa jóia do CD tantas vezes que o tema toca na minha jukebox mental involuntariamente, senhoras e senhores.

Genial - A sétima faixa do disco é, por coincidência ou não, um compasso 7/8 e esse tipo de sincronismo ou detalhe moldam a música genial de Barrosinho. Rosemary, que, com clima Black Rio-Duke Ellington, pode tanto extasiar os nossos ouvidos contemplativos quanto freqüentar os pubs londrinos ávidos e atentos por novos ''Rare-Grooves''. A complexidade rítmica dos Maracatambas é motivo de estudo para se entender a evolução da música afro-brasileira. Com influência da música européia, a híbrida Amay, com o dueto violão e trompete de Gabriel Improta e Barrosinho, emociona pela versatilidade inteligente da harmonia e da melodia presentes nas composições do CD. Fazendo um paralelo da importância do maestro Moacir Santos na música brasileira, assim como Gil Evans e Charles Mingus tiveram nos EUA, Barrosinho anda por outros trilhos, mas é John Coltrane puro, o que infelizmente com menos oportunidades de realização de uma obra tão importante. Coisas das quais o país do futebol deveria se envergonhar....

Quando se fala hoje em sentimento musical, o estereótipo de campanha publicitária com Joe Cocker cantando Unchain my heart num bar enfumaçado tem sido a adequação mais próxima de um evento em que a música não é a única expressão artística com dívidas com o sentimento. Barrosinho solando maravilhas no trompete conta, a cada inflexão, sua história e a falta que o sentimento vem fazendo nesses tempos em nossas vidas, e registra, sem sombra de dúvida, um dos melhores discos de jazz dos últimos tempos no mundo. Repito: mundo. O brasileiro tem sempre a mania de que beltrano é o melhor do Brasil porque parece que só podemos botar no altar, nas salas e cafés elegantes as fotos em preto e branco de mestres como Monk, Miles, Gillespie, Coltrane... Vamos fazer uma do Barrosinho porque ele pode e merece. O sopro do espírito é o sopro da esperança de que a música não morreu e tem um professor que pede passagem.
Ed Motta - 31/10/2001 publicado no Jornal do Brasil (Caderno B)
(reportagem copiada do Blog Br-Instrumental)http://br-instrumental.blogspot.com/

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Embaixo da escada


Foto Man Ray - A Lheure


Tive um amor, que nasceu em dia de morte
Morte de meu avô,
Diante do horror, fazer crescer a vida...
Proliferar-se no enrolar de corpos,
Como as palavras lutam, na folha
Por uma existência livre, por uma vida
E amor riscados-ensaiados
Por baixo da escada, que levava ao alto
Nós pregados ao chão, negando subidas
E o rosto dela era muito bonito...
Sinto agora aquele beijo!

Gregory Corso



Sem Palavras

É melhor homem uma palvra alongada
e depois comer o que o outro haja falado
pois nenhum homem é palavra suficiente
ao fazer sua queixa, acertar com a bota
a palavra comida estava sem gosto talvez

É melhor o homem esquecer sua dicção
ficar sem a boca
é melhor que um outro homem, eu mesmo,
aceite a restrição dele

Não conheço nenhuma palavra que seja minha
e estou cansado das dele
É melhor costurar sua boca
dinamitar seus ouvidos até a surdez
afogar seu palavrório

É melhor
que seus olhos falem e escutem, além de enxergar.

extraído de Gasolina & Lady Vestal, LPM, Coleção Olho da Rua, 1985.

A Classe Operaria Vai Ao Paraíso


Assisti numa certa feita um documentário sobre o cineasta italiano Elio Petri, que foi apresentado na TVE no seu programa Mostra internacional de cinema. Fiquei fascinado com as imagens pinceladas na tela dos filmes de Petri, então caracterizado como fazedor de um cinema politico. Poucas informações adquiri sobre o mesmo, não encontrei seus filmes em nenhuma locadora, porém como diz o ditado: Quem procura acha. Procurei, apoiado ainda numa inversão feita sobre outro ditado popular, pelo querido Chico Buarque: Quem espera nunca alcança!

Graças ao belissimo site www.makingoff.org, no qual tenho encontrado grandes filmes de todas as partes do mundo e de todas as epocas, encontrei um exemplar do Elio Petri, talvez o seu mais famoso filme: La Classe Operaia Va In Paradiso. Filme de imagens intensas, sobre um trabalhador alienado, em sua condição escrava, que busca no ritmo de sua máquina no trabalho esquecer-se de todos os seus problemas(relacionamento conjugal fracassando, distância do filho do primeiro casamento)enfim um libelo contra a exploração do trabalho. A pelicula captura toda a relação entre o homem e máquina com suas contradições e seus agenciamentos libertadores. O proprio Lulú(protagonista)vivido pelo genial Gian Maria Volonté, se considera uma máquina, alguém que através de metodos proprios faz a engrenagem na fabrica alcançar seus picos de produtividade, servindo de referência e conquistando toda antipatia dos demais trabalhadores. Destaque para seu metodo de trabalho. Com a câmera focada em close dele Lulú grita: uma bunda, uma peça,uma bunda, uma peça!!! Em ritmo alucinado, com o rosto molhado pelo liquido que esfria o metal enquanto ele o corta desvenda-se toda alucinação e repressão do desejo deste trabalhador que somente com a perda de um dedo, sente a dor da sua condição. Fica aqui a dica, deste ilustre desconhecido nosso: Elio Petri.